13 julho 2018



Seu Manoel

Já sentado, virei para encarar o tronco da árvore, de lado pra pista, e escolhi falar baixinho para não chamar atenção. Não me importo se me olham ou se incomodo os outros com minhas conversas. Não suporto é que me incomodem: "ei, doidinho", "olha ali o louco falando sozinho". Ou, de quem pensa que me conhece: "ó lá o seu Manoel de novo". Interrompem meus raciocínios. Cada um tem sua vida, seus assuntos. Se saio de casa é pra evitar que meus filhos me abordem. Antes mesmo do café, visto as calças, o jaquetão e desço a praça da 36, depois a rua, depois a outra rua. Lá estão meu banco, minha árvore e meus assuntos. Vida/morte, espiritualidade, receitas de milho, mecânica de automóveis, aeronáutica, futebol, vôlei, basquete, Brasília de 1960, botox, cisternas, rock, egoísmo, dor de estômago. Tudo é tratado, apresentado e esmiuçado. Passou um rapaz correndo de camisa laranja, que achei horrorosa. Mas hoje eu dizia sobre tecnologia, avanço da medicina, próteses ortopédicas. Um moço com perna postiça será que corre assim? E é assim que acontece e é assim que é o mundo.

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