18 maio 2013

Dia qualquer

Começava a esfriar. Entraram em casa como se fosse um dia qualquer: as chaves dela na banqueta, celular e carteira dele no vão do armário (milimetricamente centrais), a bolsa pendendo pela alça na mesma banqueta, o casaco dele no antebraço e os passos apressados, sincopados, até o quarto em busca de um cabide. Ela tirou os sapatos no corredor. Ele colocou as roupas no cesto e reparou no movimento que os ombros dela fizeram quando, de braços erguidos, prendeu os cabelos. Os seios pareciam ter obtido um contorno que os fez simétricos como nunca foram em posição normal. Ela procurava alguma coisa. Ele lhe contava cada pinta, cada manchinha, pelinhos nos braços, os ossos dos dedos e cotovelos, sentia o chulé dela. E os olhos dela estavam intrigados: onde diabos podia ter deixado o esfoliante? Ele resolveu esperá-la, sereno, até que ela veio e, afinal, lhe dirigiu o olhar. Simulou movimentos trêmulos, exagerada, pra parecer engraçada. Era engraçada, muito engraçada. Estava frio. Tomaram juntos um banho bobo, com sopro de espuma e palmas para espalhar água na cara do outro. Sorriam, gargalhavam. Até que envolveram-se, os dois, numa toalha só - velha e gostosa. Desejaram a eternidade, tal como esse dia qualquer, sem filhos, cachorros, patos, um gostando dos defeitos do outro, o outro aprendendo com um. Lennon cantava baixinho em algum lugar. Era uma da tarde; foram para a cama.

Um comentário:

Giovani Iemini disse...

singelo.
bonito.