26 maio 2012

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Henriqueta

Minha mãe sempre dizia que eu podia ser o que quisesse. Alimentava as esperanças mais puras e espontâneas da menina que queria ser bancária, mas não me libertava. Não podia me libertar. Éramos de circo e a nossa casa era um trailer, que dividíamos com outra mãe e filha. Fui educada debaixo da lona, aprendendo a ler e a contar com fantasias, malabares, bichos. Um registro de nascimento eu tinha, mas não um escolar. E foi difícil, quase impossível, aos dezoito anos, seguir o meu caminho: banco. Tinha fascinação, lia revistas, via na TV. É tanto que, durante anos, minha função no circo era a bilheteria - boa pra contar dinheiro, rápida e eficiente. Não sei se o que mais doeu foi me matricular na rede pública e começar do mínimo possível os estudos, pra ter papel que comprovasse, e, então, fazer concurso, passar, construir uma vida rotineira ou deixar minha mãe. Só tenho notícias dela, agora, quando ela resolve telefonar aqui pra minha agência.

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