31 outubro 2012

304/365
Lúcia

Fez mais do que delinear os olhos claros com vermelho fogo. Prendeu no cabelo um arranjo de contas e flores. Vestiu-se de guarany kayowá para, numa marcha, ajudar a ecoar a voz de seus irmãos. Vestiu-se de índia guerreira, fazendo com que as madeixas louras se apagassem. Não era mais Lúcia. Era mulher da mata, tinha uma causa por se dedicar e, afinal, como era gostoso irritar executivos atrasados pelo trânsito já confuso. Ayaya.

303/365
Nelma

Olha lá, a mocinha passando, um ódio contido. Pensa que ninguém percebe que aquele sorriso é falso, que ninguém sabe dos rangidos de dentes à noite. E de dia. Nasceu sem notar a indiferença da mãe.
O gosto metalizado que subia do estômago à garganta a fez lembrar do dia que terminava e a fazia intuir que agora era para sempre. Acordou cedo, tomou um banho, demorou para escolher uma das nada elegantes peças de roupa, comeu rápido, já preocupada com o tempo perdido. Poderia perder o ônibus. Terça. O marido a deixara sem carro hoje. Ônibus. Nada de preocupações com as vagas.

302/365
Paloma

Quando a tecnologia, enfim, permitiu o conserto instantâneo de erros da vida, um retrocesso: odeio o fato de que tablets não tenham ctrl+z.

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